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domingo, 22 de julho de 2012

Dia do amigo. A data já nos deixa mais sentimentais né?
Principalmente nós que estamos longe dos muitos de nossos amigos e familiares. Daí eu entro no meu Facebook e vejo que estou marcada numa foto postada por uma amiga muito querida, a Alessandra Calil.
Abri a foto e vi que era uma daquelas com diversas qualidades: Alguém com quem posso contar, alguém que adoro provocar, dona da gargalhada da minha vida e por aí vai... Daí vc coloca a marca da pessoa em cima daquilo que a pessoa significa pra você. A primeira coisa que me passou pela cabeça foi: Se eu tivesse que marcar a Alê, certamente seria em: Alguém que mudou a minha vida!
Eu amo muito a Alessandra, tenho muito carinho e respeito por ela, mas acima de tudo eu tenho gratidão profunda por tudo que ela fez por mim.
Eu sempre fui uma pessoa pra cima, engraçada, com uma personalidade super exuberante. Crise de adolescência? Não sei do que se trata. Se eu tive uma infância péssima, a minha adolescência foi a melhor do mundo! No entanto, como diz o nome do livro de auto-ajuda, mulheres inteligentes, escolhas insensatas. O único desconto a ser dado para essa fase da minha vida é de que eu tinha apenas 18 anos e estava passando por uma fase muito difícil na minha vida familiar. E assim fiquei refém de um namorado que me reduziu ao pó.
Ele decidia desde o que eu ia vestir até que tipo de programa íamos fazer no fim de semana.
O cara era um mané. E eu gostei muito dele. Ele tinha qualidades incríveis e uma alma que podia ser muito iluminada, não fosse por sua insegurança e egolatria, que rapidamente transformaram o moço angelical num anjo caído.
Ele nao regulava minhas roupas por ciúme. Ele dizia que eu era gorda e por isso nao podia me mostrar.
Alguém aí que me conhece ha muito tempo, pode por favor me dizer em que momento da minha vida eu fui gorda?!!! Oi?! Ninguém responde?
Pois é. Eu nuuuuuunca nunquinha da silva fui gorda.
Mas por causa dele eu me sentia gorda. E feia. E fraca!
Eu tinha que usar calça jeans larga com camiseta larga até o joelho.
E eu tinha que ficar abaixo das suas opiniões, das sua posições e me permiti ser o capacho de um cara que nao merecia nem um sorriso meu.
Lá pelas tantas da relação, o infeliz resolveu me pedir um tempo. Ele na verdade fazia isso constantemente, ele nunca sabia se eu era boa o suficiente pra ele, então ele tinha que meditar sobre se valia a pena torrar o precioso tempo dele comigo.
A essas alturas, a criança solitária e assustada da minha infância havia voltado com força total. Todos os bullyings da minha infância pareciam refresco ante ao assédio moral desse rapaz.
Não sei porque na vida às vezes a gente se submete a situações tão ridículas, mas eu passei maus bocados nas mãos desse rapaz.
Ele vivia pedindo pra gente dar tempo. Não sei se ele me achava com cara de relógio, mas vivia questionando se eu era mesmo a garota que ele queria, se ele devia perder a juventude do meu lado e outras pérolas do tipo. Numa dessas vezes eu finalmente concordei em "conceder" o tempo solicitado. Naquela mesma época, a universidade em que eu estudava estava fervilhando de atividades estudantis, que culminaram numa famosa "ocupação"da reitoria, que durou vários dias.
Nós levamos barracas, colchonetes, sacos de dormir e cobertores e acampamos na reitoria da universidade como forma de protesto ao preços absurdos praticados pela Universidade Católica.
Esse movimento não foi só um ato político de grandes proporções, mas também um momento marcante na vida de muitas pessoas que ali se encontraram. Esse momento marcou a vida de muitos de nós para sempre, assim como alguns desses encontros mudaram o rumo da história de muitas vidas, incluindo a minha.
Eu encontrei a Alessandra lá no meio da bagunça. Ela era linda, super popular, engraçada, bem vestida etc etc etc. Já eu,  a essa altura, era só uma sombra pálida do que já havia sido um dia. Entrei na  ocupação por convicções políticas e ideológicas, porque sob o prisma da militância social, amor sempre havia ficado mesmo num plano mais rebaixado. Eu estava mal, triste, pra baixo, mas tinha um senso de responsabilidade comunitária que me dizia que eu tinha que estar lá em meio a todo aquele processo revolucionário pós ditadura.
Uma coisa puxou a outra. Em poucos dias eu ja estava de novo iluminada. Feliz. Ativa. Participativa.
Estava rodeada de velhos amigos, e como se não bastasse, estava descobrindo um mundão de amigos novos e queridos.
Mas às vezes a sensação de sombra voltava. Meu namorado, que nem estudante universitário era, decidiu se mudar para a reitoria também.
Não por nenhuma convicção nobre, mas porque ali havia uma concentração de pessoas interessantes, música, cerveja e boemia. Em menos de um dia ele apareceu lá com a MINHA barraca de camping. Eu tinha que ficar assistindo o moço cortejando toda piriguete que aparecesse no pedaço e fingir que ela não era meu namorado. Vale esclarecer que o tempo era para uma suposta reflexão sobre a relação e não para arejar de mim experimentando "carne nova". Mas ele fazia questão de me fazer sentir um lixo cada vez que passava por mim, e eu fui tentando ficar cada vez mais longe dele para nao me machucar ainda mais. Quando ele percebeu que meus laços estavam afroxando, começou então a ficar por perto.
Eu e a Alessandra nos identificamos muito rápido. Integramos o grupo que liderava a maioria das ações. Isso ia desde a organização logistíca da ocupação até o preparo de festas, músicas, celebrações e piadas coletivas.
Só de estar perto dela eu já me sentia mais encorajada. Daí uma vez, numa das nossas rodas de violão, eu estava sentada do lado dela, rindo e ouvindo música quando meu "namorado" (não sou boazinha de poupar o nome do babaca?rs) sentou na roda e falou em voz alta: senta direito! fecha essa perna que esse shorts tá muito curto!
A Alessandra na hora respondeu: Como é que é?!!
Você tá mandando nela?
Fabi? Você conhece esse mané?
E eu só meneei a cabeça...
De onde???? - Ela perguntou chocada
E eu com um fio de voz...- Ele é meu namorado...
Pausa pra cara de chocada que ela e a torcida do flamengo fizeram naquele momento...
Todo mundo olhou pra mim como se eu tivesse dito que namorava o curupira...rs
Mas ela não se fez de rogada, olhou pra ele e respondeu na lata: Escuta aqui ô Tam Tam! Ela veste o que quiser. Ela é bonita, divertida e está cercada de amigos. Não se mete na vida dela não, entendeu?
Eu não sei expressar o conforto que senti, de que pela primeira vez em meses alguém finalmente calou a boca daquele cara. Em tese eu deveria ser a pessoa a fazer isso, mas já havia muito tempo que eu não tinha forças nem pra responder as coisas que ele me dizia.
Tivemos uma longa conversa sobre tudo o que eu estava passando. Abri o jogo e contei até das agressões verbais e esporadicamente quase físicas as quais ele me submetia. Disse que não aguentava mais, mas que não sabia mais quem eu era e que também não sabia mais como recomeçar sozinha, porque meu convívio com ele me afastou até dos meus amigos.
Depois desse dia, a Alessandra decidiu que ia cuidar de mim. Devolver a minha vida e me "salvar " do mau namorado. Ela não mediu esforços pra isso. Seu tratamento incluia desde cortar minhas saias para que ficassem curtas o bastante para que eu não parecesse uma "crente". Até aulas de maquiagem, dicas sobre perfumes, cabelos, auto-estima.
Finalmente, depois de anos desejando, eu fiquei ruiva. Desfiei o cabelo na altura dos ombros e subi num salto alto.
Alguns anos antes, eu teria considerado tudo isso como meras futilidades, mas a essa altura do campeonato eu precisava MUITO arrancar a Fabi exuberante de dentro de mim. Mas não era só isso, ela me convenceu a mudar de curso na faculdade porque eu estava muito infeliz no meu. Por causa dela e de outros amigos da reitoria eu mudei do curso de Filosofia para o curso de Jornalismo.
Eu lembro de estar muito tensa esperando o resultado sair no jornal, e ela ligando pra minha casa com o Miguel Netto e o Renato Pirauá no telefone, gritando feito louca: Você passou! Você passou!
A Alê me apresentou novos amigos, e juntas fizemos tantos outros...tão queridos.
Ela grudou em mim lá na reitoria e não me deixou desanimar ou ficar triste. No último dia da ocupação eu finalmente desmanchei meu namoro e já saí de lá de namorado novo. Quando eu e esse novo amor nos ferimos, ela estava lá de novo para me abraçar.
Minha última barreira era a auto-estima detonada. A essa altura eu já estava super bem. Bonita, bem tratada, sexy e aparentemente super confiante, mas lá no fundo eu tinha medo de ser só um "holograma" e não uma mulher real.
Assim que entrei na Facos a Alê e os outros membros da atlética me chamaram para ser a miss Facos na disputa pelo título de rainha dos jogos nos JOGOS DA UNISANTA. Claro que eu nao aceitei! Mas quem disse que a Alessandra aceita um não como resposta?
Um dia fui com ela na Unisanta para tratar algo dos jogos e ela me apresentou para a Rosa Navas: - Rosa, gostaria de te apresentar a miss Facos!
Oi???? - eu disse! rs Como assim?
Resumindo a ópera, a Alessandra "me fez " desfilar de maiô num ginásio com mais de de 3000 pessoas, de batom, salto alto e ... fio dental (sem meia tá ?). Público de jogos é uma coisa meio complicada né? Um bando de macho grosseiro (perdão pela generalização) torcendo pelo seu próprio time ( no caso faculdade). Gritaria, corneta, e eu tremendo feito bambu!
Uma das moças da FATEC, que de fato era muito feinha, tadinha, foi vaiada e ganhou chuva de papelzinho.
Eu tive dor de barriga...pensei: Em mim vão tacar ovo....pânico total!!!
Antes de entrar com meu traje de jogadora de futebol (pode rir se não me conhece, e se conhece pode rir mais ainda! rs) o coreógrafo que ensaio nossas evoluções em cena dizia: Solta a pantera dentro de vc! E eu só pensava: Eu quero sumir!!!
Subi no palco, caminhei, nao tropecei, nao cai, ninguém me xingou, até ouvi uns: Gostosa! Gata! e ri muito muito com a narração brega do locutor falando sobre meus hobbies e atividades... - Ela gosta de dança! Artes plásticas! Política! kkkkkk
Gente, um mês antes eu era um bicho do mato acuado e triste, e agora eu estava ali pondo meus medos a proa e descobrindo que tudo era uma grande besteira.
Fiquei muito amiga de muitas das misses, dei muita risada dessa história que vou ter quee contar para os netos, mas acima de tudo, experimentei uma qualidade de amor que vem do mundo das fadas. A Alessandra foi minha fada madrinha, e ela não me salvou de um namorado besta, ela me salvou de mim mesma, porque como se diz por aí, se alguém te machuca da primeira vez, a culpa é da pessoa, mas se te machuca a segunda, então a culpa é sua. Aquele cara ja tinha me machucado mais de dez, então a culpa era minha. Só que depois desse resgate de alma, eu mudei muito. Muito mesmo. Minha vida deu uma guinada de 360 graus.
Convivemos por bastante tempo. Fomos cúmplices uma da outra em situações diversas. Dividimos de segredos a fila de emprego.
Ela cuidou do meu coração como poucas pessoas seriam capazes de fazer. Volta e meia, seu namorado da época entrava na minha sala de aula (ele estudava no fim do meu corredor) e me trazia uma nhá benta com um cartãozinho: Adoro você!
Até hoje, quando alguém do Brasil vem me visitar aqui na Conchinchina (e isso é literal, porque a conchinchina fica no vietnam) eu peço pra me trazer uma nhá benta. Acho que junto com o sabor do chocolate e da maciez do marshmallow, a nhá benta traz embutida um sentimento de conforto quase espiritual, uma lembrança de amor que alenta o coração.
A Alessandra ventilou minha vida com um perfume de amor muito bonito, mas a vida real vem com suas obrigações, jornadas de trabalho, estágios, prazos e fomos naturalmente nos afastando. Ela decidiu fazer outra faculdade e eu comecei a trabalhar de dia, estudar de noite e ensaiar dança nos fins de semana. Difícil né?
Crescemos e nos distanciamos, casamos, mudamos, enfim...
Já se passaram cerca de 15 anos desde a última vez que nos vimos pessoalmente. Nunca mais nos encontramos sequer para um chá ou café, mas eu adoro a Alê e quase morri de emoção quando vi que eu estava na mensagem dela de dia do amigo. Pode parecer pouco,mas olha só, a mensagem falava para fulano, ciclano, beltrano e muitos outros. Eu não estava entre os muitos outros. Eu tinha nome e sobrenome.
Quinze anos depois eu ainda fazia parte daquele seleto grupo de pessoas as quais a gente não se esquece.
Fiquei super ansiosa para saber em que categoria ela havia me incluído naquela foto: Alguém que não esqueço? Alguém que me fez rir? Alguém de quem tenho saudades? Então meus olhos param diante do inesperado. Meus lábios tremem e as lágrimas escorrem pelas minhas bochechas enquanto eu leio letra por letra:
Alguém que mudou a minha vida!

3 comentários:

  1. Ai, Fabi... Li seu relato como quem lê a própria história. Guardadas as devidas diferenças, no meu caso foi um MARIDO por quase 20 anos, que me deixou no chão, me achando burra, feia, "toda errada"... Mas, thanks God, também encontrei uma amiga que me dissesse, literalmente enquanto endireitava minha coluna, com uma massagem com os pés: "Você NÃO é LIXO! O LIXO é ELE!"
    Enfim... entendo bem o que você passou e o valor que vc dá à Alessandra! Parabéns por repartir sua história! Eu não posso falar abertamente da minha, por conta dos filhos...

    Beijo enorme!

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  2. Amei! Apesar ed conhecer bem a estória, não consegui parar de ler. E hoje, Mané ou não Mané, você está aí, linda e maravilhosa como sempre foi.
    Amo vc, estrelinha..

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  3. Caramba te escrevi um monte, e não conseguir postar. Enfim...Te digo, parabéns e que não precise mais encontrar essas experiências para saber o quanto você vale! Você vale todo o tesouro do mundo.

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